Big Techs e Trump: Uma Aliança Improvável que Pode Mudar o Mundo
- catarinacapital1
- 22 de jan.
- 6 min de leitura
Os Estados Unidos têm um novo presidente! Donald J. Trump assumiu o cargo nesta semana em um dia congelante em Washington. Muitas coisas chamaram a nossa atenção na cerimônia de posse: um evento fechado por causa do frio, o chapéu da Melania, a presença de todos os ex-presidentes americanos vivos e muito mais.
Mas nada chamou tanta atenção como a presença, em posição de destaque, dos CEOs e founders de praticamente todas as Big Techs: Musk, Zuckerberg, Tim Cook, Sundar, Sam Altman e até Shou Zi Chew do TikTok. Posicionados no lugar reservado para a família Trump, novos secretários de Estado e alguns fiéis aliados, os líderes do mundo digital estavam lá, cada vez mais perto do poder, e vamos falar um pouco mais sobre isso e os impactos no mundo, economia e startups.
Que as Big Techs já circulavam nos bastidores do poder há muito tempo não é novidade para ninguém; o que mudou foi que vimos elas, pela primeira vez, na linha de frente desde a campanha. Em um Vale do Silício historicamente democrata e de esquerda, algumas figuras como Musk, Peter Thiel e David Sacks atuaram de forma direta na campanha eleitoral, comprando briga com gente grande e vencendo a corrida. Após a eleição, Zuckerberg e Tim Cook passaram a conversar recorrentemente com o presidente sobre temas estratégicos, e isso deve ser uma constante nos próximos quatro anos de governo.
Não vou entrar em temas políticos e nos ventos que mudaram de democrata para republicanos em parte do Vale do Silício (e uma grande parcela da população geral...), mas vou focar nos temas econômicos mais relevantes que precisam ser discutidos:
Liberdade de Expressão x Fake News
Não, eu não vou entrar nesse tema... muita polêmica.
Inteligência Artificial
Assim como no boom da internet nos anos 1990 e 2000, a forte liderança dos EUA no tema de IA é uma oportunidade econômica gigantesca, e Trump sabe muito bem disso. Apesar de defender uma maior industrialização dos EUA e altos investimentos na exploração de petróleo, o novo presidente sabe que o único setor em que o país tem um claro diferencial competitivo, de rápida oportunidade de geração de emprego e domínio global, é a IA.
Do hardware (Nvidia, Broadcom), passando pelos modelos (OpenAI, Meta, Google) e pelas aplicações finais (Apple, Tesla), os EUA possuem um domínio muito grande desta nova onda tecnológica. Os grandes desafios para os EUA são aqueles justamente onde a China possui liderança e vantagens: no aumento da geração de energia (estima-se que será necessário adicionar 500 TWh até 2030 – o equivalente a oito usinas de Itaipu); e na regulação e políticas de uso de dados. Ambos os problemas não dependem apenas de dinheiro, mas também de força política.
É o famoso ganha-ganha. Os EUA liberam investimentos pesados em energia (principalmente nuclear) e trazem uma legislação “business friendly”, enquanto as Big Techs abrem a carteira e criam empregos e riquezas. Essa parceria já está bem desenhada, visto que o Vale do Silício colocou um membro no papel de liderança do novo governo para a área de IA e cripto, David Sacks (venture capitalist, PayPal Mafia, founder Yammer), e, para secretário de Energia, Chris Wright (executivo de longa experiência no setor de petróleo e energia nuclear).
“America First”
Esse tem sido um dos grandes pilares da campanha e das primeiras medidas do governo Trump: colocar cidadãos e empresas americanas em primeiro lugar. E isso interessa muito às Big Techs. Parte delas são banidas ou possuem restrições para atuar na China, sofrem pressões regulatórias absurdas e multas da União Europeia e até brigam com o judiciário de países latino-americanos.
Até então, o governo americano sempre se manteve passivo neste campo, mas com “America First”, isso tudo deve mudar. Um exemplo são as multas da União Europeia, que somaram mais de US$ 30 bilhões nos últimos 10 anos, por acusações de violação da lei antitruste, LGPD e de informação, mas que, para parte do mercado, não passam de um imposto disfarçado. Daqui para frente tudo deve mudar: a União Europeia quer multar a Apple? Sem problemas, toma uma tarifa de importação sobre o vinho francês. O Google banido na China? 100% de imposto sobre carros elétricos chineses. X/Twitter fora do ar no Brasil? Imposto sobre café, aviões e carnes.
Em um momento em que todo o mundo (exceto os EUA) sofre para manter o crescimento econômico e as contas públicas estáveis, comprar essas brigas com Trump parece ser um tiro no pé, e as Big Techs vão ganhar muito.
Competição e Divisão das Big Techs
Um dos poucos temas unânimes entre toda a comunidade de tecnologia e de venture capital foi a atuação do FTC (autoridade antitruste americana – o CADE deles) nos últimos anos. Com uma visão de que Big Techs são um problema, o órgão congelou o mercado de M&A e ainda iniciou campanhas para dividir em pedaços as grandes empresas do setor, como forma de acabar com o que via como “práticas não competitivas”.
Antitruste e práticas anticompetitivas sempre são temas importantes que devem ser analisados, mas bloquear completamente o mercado não parece fazer sentido. O auge disso foi 2022, quando a Amazon foi vetada de fazer a aquisição da iRobot, uma empresa de aspiradores de pó inteligentes... No caso do Google, o Departamento de Justiça, com apoio do FTC, abriu processo para quebrar a empresa em pedaços, separando o Chrome e possivelmente o Android em empresas separadas.
Com Trump no governo, não significa que a vida das Big Techs será fácil no tema de antitruste, e a visão geral dos apoiadores do republicano no Vale do Silício é de que muita coisa ainda deve ser feita no tema, mas o foco deverá ser práticas operacionais antitruste, como, por exemplo, a Microsoft fornecendo de graça o Teams, como forma de eliminar o Zoom e o Slack.
Visão Geral
As Big Techs deixaram de ser há muito tempo apenas grandes negócios digitais para se tornarem os maiores geradores de novos empregos dos EUA, que investem bilhões em ativos reais e movimentam a economia americana.
Em um ambiente econômico cada vez mais complexo, o setor se mostra como o de maior oportunidade e diferencial para os EUA. Trump quer capturar esta oportunidade, e, na minha humilde e talvez inocente opinião, os gigantes de tech não querem benefícios, créditos fiscais ou proteção de mercado; querem apenas liberdade para crescer, investir, competir e prosperar. Acredito que a experiência que estes empreendedores e executivos estão tendo na Califórnia mostra o risco da falta de liberdade para os negócios e como isso pode impactar o sucesso de uma empresa, fazendo com que várias companhias e pessoas fugissem para o Texas, Tennessee e Flórida.
Em um caso emblemático, a Comissão Costeira da Califórnia, que é responsável por atividades econômicas nas praias do estado, limitou o número de lançamentos de foguetes que a SpaceX pode fazer. Apesar de autorizações do governo federal, NASA e demais órgãos responsáveis, uma comissão que também é responsável por regular a venda de água de coco na beira da praia, por questões políticas e pelo “risco” do barulho dos foguetes atrapalhar as focas marinhas, limitou um dos cases mais relevantes de sucesso e empreendedorismo, que é um tema de segurança nacional.
A busca pela liberdade e o sucesso são pilares da sociedade americana. As Big Techs estão abraçando o governo Trump em troca disso e, por consequência, trilhões de dólares. Assim como a revolução industrial na Inglaterra há 200 anos, pode ser um dos grandes mecanismos de crescimento econômico da humanidade. Basta saber se, com todo esse poder e sucesso, qual será a atitude e o papel das Big Techs. Só o futuro dirá.
Para o Brasil, o cenário pode ser altamente positivo. Com a China em desaceleração, o crescimento econômico dos EUA pode ser o grande motor da economia mundial, trazendo prosperidade a todos. Mais commodities brasileiras indo para os EUA, maior demanda por aviões da Embraer e assim por diante. Para o setor de tecnologia no Brasil, a oportunidade de surfar a onda de IA e outros avanços é gigante por conta da proximidade física (nearshoring), mão de obra altamente qualificada e custos baixos por conta da desvalorização cambial, abrindo uma janela para startups e desenvolvedores se inserirem nesse mercado.
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